Quando se fala em superdotação, ainda é comum que a imagem associada ao tema seja a de crianças que se destacam na escola ou conquistam medalhas em olimpíadas científicas. No entanto, a superdotação vai muito além da infância e não se resume ao desempenho acadêmico: trata-se de um modo de funcionamento cognitivo que acompanha o indivíduo ao longo de toda a vida. Segundo a Associação Mensa Brasil, o país possui 5 mil pessoas com superdotação, também chamadas de “superinteligentes”, garantindo a sexta posição no ranking global Mensa Internacional, principal organização de alto QI do mundo. Do total de identificados no país, 1,9 mil são crianças e adolescentes e 3,1 mil são adultos.
“Superdotação não é uma fase que se encerra com a adolescência. É uma característica do funcionamento do cérebro, sustentada por diferenças estruturais e funcionais que permanecem na vida adulta”, explica a neuropsicóloga Geórgia Menezes, mestre e doutoranda em Psicologia pela UFPE e sócia do IAN – Instituto Harmonia e Neurodiversidade.

Segundo a especialista, a mente superdotada se diferencia não apenas pela velocidade de aprendizado ou pela quantidade de informações assimiladas, mas principalmente pela forma como organiza significados e estabelece conexões complexas. “Enquanto a cognição típica vê o mapa, a cognição superdotada quer entender a lógica da cartografia. Ela constrói redes associativas densas, cruza conceitos improváveis e enxerga padrões que muitas vezes passam despercebidos”, afirma.
Esse estilo mental intenso pode impulsionar a criatividade e a inovação, mas também traz desafios. A falta de identificação da superdotação na vida adulta está associada a consequências importantes para a saúde emocional e profissional. Muitos adultos com altas habilidades enfrentam dificuldades para se adaptar a estruturas de trabalho rígidas, passam por ciclos de subemprego e rotatividade, e oscilam entre períodos de alta performance e de tédio profundo. “A ausência de diagnóstico pode gerar impactos significativos na autoestima e contribuir para quadros de ansiedade, perfeccionismo extremo e até burnout”, destaca Geórgia. Nas relações interpessoais, é comum que esses adultos relatem sentimentos de inadequação e percebam sua intensidade como um problema.
O desconhecimento sobre a superdotação adulta também é alimentado por mitos persistentes. A crença de que só é superdotado quem se destacou na escola, de que a superdotação “desaparece” com o tempo ou de que se resume a um QI elevado ainda impede muitas pessoas de compreenderem suas próprias singularidades cognitivas e emocionais. Para identificar a superdotação na vida adulta, existem caminhos possíveis, como entrevistas clínicas, análise do histórico de vida e avaliação psicométrica conduzida por profissionais qualificados. “Mais do que um rótulo, a devolutiva precisa ser psicoeducativa, ajudando a pessoa a entender sua maneira de funcionar e oferecendo ferramentas práticas para lidar com sua intensidade”, explica a neuropsicóloga.
Reconhecer essa condição é, segundo a especialista, um ato de cuidado e pertencimento. “Identificar a superdotação é dar linguagem à diferença, validar trajetórias que muitas vezes foram marcadas por inadequação e abrir espaço para transformar potencial em realização”, conclui.
Sobre o IAN – Inaugurado em 2025 no RioMar Trade Center, em Recife, o IAN é um espaço pioneiro no Brasil dedicado ao acolhimento e cuidado de adolescentes e jovens adultos neurodivergentes de Nível 1 de suporte, além de pessoas LGBTQIAPN+. Fundado pela psicóloga e neurocientista Geórgia Menezes e pela pediatra e psiquiatra Isla Queiroz, o instituto reúne clínica, pesquisa, educação e apoio à funcionalidade em uma abordagem transdisciplinar, centrada na pessoa e baseada em evidências científicas. Com uma equipe qualificada e também composta por profissionais neurodivergentes, o IAN oferece atendimento clínico integrado, formação profissional, apoio familiar e estímulo à autonomia, promovendo ciência, cuidado e cidadania. Mais informações: www.institutoian.com.br e @ianinstituto.