Se você acessou alguma rede social durante essa semana, com certeza, viu ou ouviu falar sobre “A Mulher da Casa Abandonada”, um podcast que virou assunto em todas as rodas de conversa na internet, seja pelo conteúdo ou impacto gerado por ele.
O podcast é uma reportagem, resultado da investigação jornalística feita por Chico Felitti e equipe da Folha de S.Paulo, do caso de uma senhora que mora numa mansão mal cuidada, no bairro de Higienópolis, área nobre de São Paulo, que despertava curiosidade em quem a via nas raras vezes em que aparecia na vizinhança.
Nos episódios, Chico narra que se tratava de uma herdeira de família rica de SP, Margarida Bonetti, procurada pelo FBI sob a acusação de um crime hediondo praticado no período em que viveu nos Estados Unidos: manteve por 20 anos, uma empregada brasileira em condições análogas à escravidão, além de agredi-la e negar atendimento médico.
O podcast colocou luz na temática de escravização de empregadas domésticas, em pleno século 21, e também verdadeiros holofotes sobre outro tema: a forma como os brasileiros tem consumido conteúdo.
Em primeiro lugar no mais ouvido na sua categoria (Crimes Reais), o podcast em questão já soma cerca de sete milhões de downloads, 129 mil avaliações no Spotify. No Google, a busca de termos relacionados aumentou 5000%, a hashtag #amulherdacasaabandonada já ultrapassa mais de 139 milhões de visualizações de conteúdos que vão desde resumos do caso, curiosidades extras, repercussões, visitas à frente da casa e, pasme, até coreografias de músicas em alta na rede.
A repercussão não ficou só nas redes sociais. Na última quarta-feira (20), enquanto a polícia cumpria um mandado de busca e apreensão na casa, após denúncias de abandono de incapaz, a ativista Luisa Mell resgatava mais um animal sob suspeita de maus tratos, tudo isso sendo transmitido numa live para mais de 30 mil pessoas no Instagram, fora a multidão na rua aos gritos de protesto, helicóptero e drones fazendo a cobertura ao vivo para programas como “Brasil Urgente” e “Cidade Alerta”. Um verdadeiro e vergonhoso espetáculo midiático!
Mas, se estamos em tempos de conteúdos superficiais e vídeos com menos de 60 segundos, o que fez tanta gente acompanhar um produto jornalístico, com episódios em áudio, com mais de 50 minutos?
Talvez por seguir a tendência do Infotenimento, conteúdos que informam e são de relevância social, mas consumidos como se fossem entretenimento. Ou seja, assuntos reais, chocantes, mas ainda presentes na sociedade como racismo, condições de trabalho escravo somado a um storytelling semelhante as séries de TV.
A escolha do formato em Podcast torna a narrativa ainda mais envolvente que prende a atenção do público em um conteúdo jornalístico sério.
Por outro lado, a repercussão tomou ares de entretenimento, como se fosse uma fofoca imperdível ou uma obra de ficção do momento.
É o ônus e bônus do mérito de uma história bem contada.